sexta-feira, julho 04, 2003

Pseudo feudos e Talibãs

Pseudo feudos e Talibãs

Manuel Araújo - ano 2003

Como me considero ainda, um cidadão livre, de pensar e agir e de acordo com o que a Lei me faculta, decidi apoiar subscrever e comentar um abaixo-assinado surgido em Caldelas em que pediam às autoridades competentes, a devolução do único espaço que inicialmente estava destinado ao teatro, ao folclore, conferências, congressos, cinema, ensaios vários, etc, ou seja, um Auditório para fins culturais.

O referido espaço, propriedade da Junta de Freguesia, funciona, ilegalmente há mais de dois anos, isto é um facto, pois não possui qualquer espécie de licença, seja ela de regulamentação, abertura ou de comercialização de bebidas alcoólicas, entre elas o vinho de produtores privados, sem qualquer controle, nem tão-pouco licença das máquinas de jogos electrónicos.

Em declarações públicas, um membro da junta de freguesia afirmou que a exploração do local foi cedida ao Grupo Coral / Comissão de festas, mas por outro lado, fonte bem colocada do Grupo Coral, contesta e refuta a afirmação e assegura que “o Grupo Coral, não tem nada a ver com a tasca”.

Autoridades concelhias e distritais, são, desde há algum tempo, conhecedoras da situação, mas nada aconteceu até ao momento. Será que evocaram também a excepção à Lei, tal como fizeram em Barrancos com o toiros de morte?

Além das ilegalidades expostas, acresce ainda o facto, de o espaço não ter condições de segurança ou de higiene – segundo o parecer recente, dos técnicos da Câmara Municipal de Amares, que chegaram à conclusão de que — “o espaço é inapropriado para auditório ou para biblioteca”…

É estranho, pois, supostamente, foram os mesmos serviços, que deram o parecer favorável, aquando a sua construção para o fim de um Auditório .

Mas não serve para auditório ou biblioteca agora, dizem os técnicos. Mas servirá para serviço de tasca ?

À margem de todas as regras de bom relacionamento com os restantes condóminos, resolveram, sem dar satisfação a ninguém, abrir enormes orifícios na parede do imóvel, para o exterior, para assim expelir os fumos.

Perante a minha tomada de posição, sobre a situação, tudo na minha vida se complicou. Senão vejamos;

Presumo que seja apenas “coincidência”, mas…

• pneus cortados,
• inscrições murais de teor intimidatório,
• envenenamento dos cães dentro do meu próprio quintal,
• o pão da manhã espalhado, pelo chão

• rodas desapertadas
• e a recentemente e repetida vandalização por lacragem, do canhão da fechadura da porta do meu escritório, impedindo-me de entrar,

Isto já dá que pensar, por isso, apresentei queixa na GNR, contra “desconhecidos”.

Recordo, uma confidência de um amigo, que me avisou quando comecei a denunciar estes casos, que os “Talibãs” iriam atacar-me… e que eram “talibãs” pseudo feudais, homens ressabiados, habituados a serem servidos e adorados, que detestavam quem lhes fizesse sombra, ou lhes falasse alto e que não gostavam também, que ninguém se lhes metesse pelo caminho, ou lhe ocupassem as clareiras.

Ah… disse-me também esse meu amigo, que as mulheres deles, nem sempre usavam “burkas”. Essa afirmação, eu não a entendi… Não a entendi…. e fiquei admirado, porque as tribos verdadeiramente talibãs, são de outras paragens, o que ainda existe aqui, são alguns caciques que pensei estarem já definitivamente acantonados, extintos ou em hibernação.

Sabe-se, que alguns desses talibãs/caciques mais jovens, conseguiram escapar e tinham-se  integrado plenamente e posto de lado o fundamentalismo, que, durante décadas os orientou. Acho que alguns deles evoluíram e aprenderam a respeitar e a viver em sociedade e em paz…

Tenho pensado, no alerta desse meu amigo e agradeço-lhe ter-me avisado, mas não tenho receio, porque os “talibãs” verdadeiros não existem em Caldelas, existe apenas alguns caciques cobardolas, que lançam a pedra (ou mandam lançar) e escondem a mão. Ou melhor, ordenam aos pobres “jaquinzinhos” que o façam.

Os verdadeiros talibãs, os quais também nada aprecio, esses sim, são corajosos e dão a cara, recorde-se, que mesmo contra a vontade de todo o Mundo, eles dinamitaram e destruíram as estátuas dos Budas Gigantes no Afeganistão. Estes de Caldelas são diferentes, são falsos e actuam cobardemente na calada da noite.

A propósito: alguém sabe, o que fizeram eles, com os camiões de pedra, gravilha e cascalho “desaparecidos”?

Eu sei… e muita gente de Caldelas também sabe, mas com medo nada diz…



quinta-feira, julho 03, 2003

ANTÓNIO VARIAÇÕES 19 anos depois da sua morte…

Manuel Araújo (*)


António Joaquim Rodrigues Ribeiro, nasceu no Minho, Fiscal, uma pequena, verde e pacata freguesia de gente afável, muito perto da estância termal de Caldelas no Concelho de Amares, no dia 3 de Dezembro de 1944. Era filho de Deolinda de Jesus, falecida há dias e de Jaime Ribeiro, também falecido.


O começo

Contou-nos a mãe, Deolinda de Jesus, recentemente falecida, que durante os estudos primários, concluídos na escola local, ajudava nos trabalhos da terra, mas sempre que podia “escapulia-se” para todo o sítio onde houvesse uma feira, romaria ou festa. O “bichinho” da música herdara-o de seu pai que também tocou acordeão e cavaquinho.

O “Tonito” – era assim que lhe chamava a mãe– depois de terminar a escola primária, experimentou ainda um emprego na oficina de quinquilharias do "Caco" em Caldelas, desistindo pouco tempo depois. Sonhava com outros horizontes, assim, e apenas com 12 anos, rumou em direcção a Lisboa para casa de uns primos, terra de sonhos e das oportunidades. Começou como marçano, que não era o que desejava, para alguns meses mais tarde conseguir um trabalho num escritório. Esteve na capital até á idade da tropa para ser destacado para Angola. Cumprido o serviço militar, regressou para pouco tempo depois partir para Londres, onde tinha um irmão, o José, e onde começou a trabalhar como empregado de mesa.

© DR
Nasce o António Variações

Em 1976, ano do falecimento de seu pai, regressou a Portugal para partir de novo, mas desta vez o destino levou-o até Amsterdão, Holanda, onde frequentou durante um ano um curso de cabeleireiro. Voltou a Lisboa para começar a exercer a sua nova profissão. Durante o dia trabalhava num salão de cabeleireiro e á noite, juntamente com o grupo musical “Variações”, dedicava-se à sua paixão de sempre , a música. O nome “António Variações”, provém do grupo com quem começou a cantar.
A sua primeira aparição em público, foi na feira popular de Lisboa, num programa da Rádio Renascença, com os UHF de Manuel António Ribeiro.

A Moda

O António era diferente, não ligava à moda, — a moda torna as pessoas todas iguais — dizia ele. Tinha um gosto muito peculiar de se vestir, que alguns classificaram de sofisticado, excêntrico, extravagante e ridículo, mas o António foi persistente, seguiu o seu próprio caminho e venceu, até que começou a ser imitado, hoje, qualquer um usa brincos...


O estrelato

Em 1978 assinou um contrato com a editora Valentim de Carvalho, mas só quatro anos mais tarde é que gravou o seu primeiro trabalho, “Povo que lavas no rio”, um tema bem conhecido de Pedro Homem de Melo e imortalizado pela saudosa Amália . “Estou Além”, é um outro tema da sua autoria. No ano seguinte, editou “Anjo da Guarda”, que o catapultou definitivamente para o estrelato nacional.
Foi entregue á família, a título póstumo, um "disco de platina" referente ao trabalho " O melhor de António Variações", resultado da venda de mais de 40 mil exemplares, o qual nos foi orgulhosamente exibido pelo irmão Carolino.
No final de 2000, foi reeditado um novo CD, "Dar & Receber" com um tema inédito do António Variações, esgotando-se assim o seu legado vocal.

A família e os amigos

O António sempre visitou regularmente a mãe e os amigos em Fiscal, a família era para ele tudo. Não havia entrevista alguma que ele não falasse da mãe, dos irmãos e das irmãs. O António era o 5º filho, dos dez que a Deolinda de Jesus teve.
Na sua terra natal, era sem vaidade nem vedetismo que se misturava com os amigos e conhecidos, que o recordam com imenso orgulho e saudade.

O trabalho, a doença e o fim

Apareceu em inúmeros programas de Televisão e da Rádio, mas foi no programa “ A festa continua “ do Júlio Isidro - do qual era também amigo e cliente da barbearia - que apareceu na TV pela última vez. Semanas mais tarde, o António foi internado no hospital Curry Cabral, com complicações que se agravaram vertiginosamente. Broncopneumonia Bilateral Extensa, foi a doença que lhe foi diagnosticada, perdendo em poucos dias 20 quilos. O António, viria a falecer na madrugada do dia de Santo António, 13 de Junho de 1984. Tinha 39 anos e foi a primeira personalidade pública que se suspeita ter morrido de sida em Portugal.
No velório, na Basílica da Estrela em Lisboa, foram muitos que lhe quiseram prestar a última homenagem e o último adeus ao seu ídolo. Estiveram também presentes, além de outros, os “Heróis do Mar”, a Lena d´Água, a Maria da Fé e a sua grande amiga Amália Rodrigues, com ele chegou a actuar em 1983 na Aula Magna da Universidade de Lisboa e tinha pelo António um carinho muito especial.
O corpo do António, foi transladado para Fiscal, Amares, sua terra natal, onde está sepultado e ainda nos dias de hoje continua a ser visitado por gente anónima oriunda um pouco de todo o país.

O reconhecimento

Em Amares, existe já uma rua com o seu nome, mas, a Assembleia Municipal em deliberação camarária, de Junho de 2002, por proposta da deputada Raquel Mendes e por unanimidade, deliberou homenagear o António Variações, no próximo ano de 2004, em data ainda incerta.

Para organizar a homenagem, foi criada uma comissão, composta por várias individualidades do Concelho. Dessa comissão, faz parte o presidente da Junta de Freguesia de Fiscal, Sr. Bernardino, com quem falamos e se mostrou “ bastante preocupado”, porque “falta menos de um ano e ainda está quase tudo por fazer”, disse-nos, apreensivo.

Segundo nos afirmou, “a Câmara, não tem possibilidades financeiras para suportar os custos da homenagem, existem outras prioridades”, por esse motivo, “apelo à união de todos, Câmara, membros da Comissão, Empresas, Comunicação Social e todos os particulares, para que comecemos a trabalhar juntos e possamos fazer a homenagem em meu entender, tardia, mas merecida, ao homem, que viveu no tempo errado. Se fosse hoje, seria certamente melhor compreendido”, conclui.

Entre outras iniciativas, que pensam levar a efeito, consta uma homenagem nos Paços do Concelho, concertos e exposições.
Também, na freguesia de Fiscal, num largo que irá ter o nome do artista, será erigido um busto.
Igualmente e um pouco pelo país, estão previstas outras iniciativas.

(*) in Terras do Homem/Praça Local - 2003

ACTUALIZAÇÃO



Busto erigido em Fiscal - Amares

© Manuel Araújo