terça-feira, novembro 08, 2005

Entrevista — Orlando Dias Agudo

Orlando Dias Agudo

Nasceu em Mouriscas em 1938, é abrantino, estudou nos Liceus D. João de Castro e Gil Vicente, tem 2 filhos. É um notável jornalista, que fez carreira na Imprensa, Rádio e Televisão. Em serviço, viajou pelo mundo inteiro, recebeu vários prémios e Troféus.

O Orlando, é um amigo que está connosco (1) mensalmente, com a sua rubrica “Nós por cá” e nesta entrevista, fala-nos de si e lança um desafio a todos os leitores...

Manuel Araújo



Como é que tudo começou e porquê jornalista ?

- Tudo começou nos tempos do Liceu: na disciplina de português, o que mais gostava era de fazer redacções…e eram elas que me davam a nota alta que me permitia alcançar uma média aceitável. Um dia, o meu professor de Educação Física, sabedor dessa minha apetência para a escrita, perguntou-me se eu queria escrever para um jornal desportivo chamado Record. Respondi que sim. Então, estabeleceu contacto com o Director (na altura o professor Fernando Ferreira) e ficou decidido que iria fazer a cobertura de toda a actividade desportiva da Mocidade Portuguesa. Isto, para tirar um fardo das costas de um outro jornalista (Guita Júnior) que já tinha muitas modalidades à sua responsabilidade. Pouco tempo depois, o editor (Monteiro Poças) começou a marcar-me outros serviços, que eu cumpria a rigor só para ver o meu nome impresso no corpo do jornal.
Foi este o “pontapé de saída” para uma profissão cheia de encantos, da qual não me arrependo de ter seguido, em prejuízo de um outro qualquer curso superior que certamente cumpriria com interesse menor. Os meus primeiros passos no jornalismo foi pois nos jornais.

Existe ainda muito público da nossa idade, que o recorda da Rádio... e depois ?

Depois, continuando a escrever para o Record, veio a Rádio: Havia no Rádio Clube Português programas de produtores independentes e um deles (Gilberto Cotta) convidou-me para ser o assistente de produção do Talismã. Aceitei, até porque, entretanto, tinha aprendido muita coisa de Rádio numa escola que deu muitos e bons profissionais. Era a Rádio Universidade. No Talismã permaneci vários anos até que o próprio Rádio Clube Português me proporcionou entrar para os seus quadros também como assistente de produção. Foram muitos e bons anos nessa função e naqueles estúdios. Inclusive na madrugada do 25 de Abril de 1974, quando o Movimento das Forças Armadas abriram os armários das músicas proibidas e nos deixaram passar o que só se ouvia offline.

Como ingressou na Televisão, que é sem dúvida daí, que a maioria do público o conhece, quer contar ?

Vivida a experiência dos jornais e da Rádio, faltava conhecer o mundo fabuloso da Televisão. E um dia, o saudoso Adriano Cerqueira convidou-me para a sua equipa da RTP, mas para isso teria de abandonar a Rádio. Aceitei sem hesitar. E durante mais alguns anos lá estive, tendo feito de tudo um pouco: desde repórter a editor, passando por apresentador de quase todos os programas desportivos da época. Muitas histórias poderia contar dessa aventura televisiva, mas isso ficará para outra altura.

E agora… Está aposentado, parou ou tem projectos?

Agora, recordo o passado e vou escrevendo…para mim. Histórias imagináveis com personagens que invento e que vão sendo guardadas na gaveta das minhas memórias Prometo não escrever um livro. O que vou guardando é só para mim mas estou disposto a desafiar quem quer que seja para, em conjunto, escrevermos uma história. Porque é bom, muito bom mesmo, sentirmo-nos “donos” dos destinos dos personagens que vamos criando. Será que algum leitor quer jogar comigo esse jogo?

Quer explicar melhor, como devem fazer para participar e para onde devem ser enviados os textos?

Aqui a seguir vai o inicio de uma história. Se quiser dar-lhe continuidade, faça-o e mande o resultado para a minha caixa de correio electrónico. Prometo continuar essa história.

Tome nota do meu endereço: ordapt@yahoo.es
(Não estranhe o “es”. É assim mesmo…)

E quem não tiver email?

Aqui, no final do conto poderá escrever no local reservado aos comentários.

(1) Lusitano de Zurique

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"A 100 à hora"

Capítulo 1




Não ia com pressa...
Rodava à velocidade máxima permitida naquela auto-estrada, não obstante o carro como o piso convidarem a carregar no acelerador...
Não era ainda noite, a viagem iria demorar ainda umas horas, as suficientes para imaginar como seria aquele fim de semana, longe do escritório, dos casos ainda por resolver, das estratégias a aplicar em cada um dos julgamentos que já tinham data marcada.
O sucesso que tivera nos primeiros julgamentos, transformaram-me num advogado muito procurado, fazendo engrossar talvez depressa demais, a minha carteira de clientes. Agora, era tempo de parar umas horas, gozar os prazeres de um fim-de-semana prolongado, sem agenda, sem compromissos, sem horas marcadas para o que quer que fosse.
A auto-estrada não estava muito concorrida; podia até dizer-se que ela era toda minha, já à minha frente não rolava mais nenhum carro e, vindo de trás, nenhum outro ameaçava ultrapassar-me.
O corredor escuro de betão era todo meu...
Tanto mais que, não tendo necessidade de rasgar estradas citadinas, podia olhar despreocupado para a paisagem que não via há tanto tempo: campos de cultivo verdejantes ondulando ao sabor do vento de fim de tarde, aqui e ali uma ave que saia do seu refúgio de calor e voava para outra sombra que seria a sua cama da noite que não tardaria a chegar....
Foi então que vi, parado na berma da auto-estrada, um outro carro; e, a seu lado, uma mulher fazendo sinais, pedindo certamente ajuda. Parei uns metros mais à frente e pelo espelho retrovisor, apercebi-me que se tratava de mulher mais ou menos da minha idade, vistosa, bem vestida, cabelos compridos que esvoaçaram enquanto corria para junto do meu carro.
-Desculpe....mas talvez me possa ajudar....
- O carro pregou-lhe a partida...
- Não sei o que se passa....vinha a andar e, de repente, ouvi um barulho estranho e parou...e começou a deitar fumo do motor....
-Vinha depressa demais, certamente....
-Não posso dizer que vinha devagar....mas já tenho andado mais depressa....
-Vamos lá ver se consigo resolver o seu problema....

Sai do carro e dirigi-me ao bólide que se recusava a andar. Era um potente carro, topo de gama, não muito usado, talvez o ultimo modelo da marca que eu, em jovem, sonhava ter um dia. Pedi-lhe para se sentar e para abrir o capot. Fê-lo de uma forma dir-se-ia que estudada. Quando se sentou, a saia travada que usava deixou ver um bom naco de perna, não sendo necessário ser especialista no assunto para logo se adivinhar o desenho perfeito do seu perfil. Quando abriu o capot, ofereceu-me um sorriso das mil e umas noites, através de uma boca feita para beijar, lábios carnudos muito bem pintados, enquadrados nuns olhos verde-esmeraldas que chegavam para pensar noutros convites....
Depressa cheguei à conclusão que sem um arranjo muito profundo, aquele carro não sairia dali pelos seus próprios meios. E disse-lhe sem qualquer espécie de reservas:
- O seu carro adoeceu gravemente....
- Acha que não consigo sair daqui?
- No seu carro certamente que não....
- E agora, que posso fazer?
-Acho que o melhor é fecha-lo bem...e vir comigo até à cidade mais próxima. Lá encontraremos alguém que o venha buscar e que lhe substitua a peça que partiu...Quer aceitar a oferta?
- Fico muito agradecida, mas a cidade mais próxima ainda fica longe....
-É para onde vou.
-Nesse caso, se quiser ter essa amabilidade....

Foi ao porta-bagagem, tirou a pequena mala que transportava e sentou-se a meu lado. Confirmei, nesse entre tempo, que era uma mulher dos pés à cabeça. Com as curvas nos locais próprios, alta, loira, bonita até. Instintivamente olhei para a sua mão esquerda: lá estava uma aliança de casada, não muito velha, sinal de que não morava ali há muito tempo....
Durante os primeiros quilómetros permanecemos em silêncio. Depois, foi ela quem tomou a iniciativa....
-Espero não estragar a sua viagem....
-Não estraga,,,, digamos que até quebra a monotonia em que vinha....
- Faço esta viagem todos os fins-de-semana, e esta é a primeira vez que me acontece ficar parada no meio do caminho...
- Às vezes acontece...vai passar o fim-de-semana com seu marido?
-Que o leva a pensar isso?
-Sei lá...apenas dedução....
-Não, não vou ter com meu marido....Esse foi para fora do país, um congresso qualquer....eu venho para passar uns dias sozinha, tranquila, sem nada de concreto para fazer...sem horários, sem compromissos, apenas e só descomprimir....
-Exactamente como eu....só que não tenho mulher, portanto não tenho que pensar o que ela estará a fazer em qualquer local....
- Solteiro?
- Sim...ou antevissem querer, casado com a minha profissão....
-Posso saber qual?
-Advogados você?
- Professora universitária, porém sem exercer...
- Por opção?
-Pode-se dizer que sim....

Aos poucos fomos fazendo o retrato de cada um de nós. Fiquei a saber que o marido era um investigador que passava mais tempo no estrangeiro do que em casa e que ela começava a sofrer as consequências de um casamento pouco assistido se valia a pena dar assistência àquele casamento, pensava eu....
Ao fim de duas horas, mais minuto menos minuto, chegámos finalmente à cidade onde eu ia ficar naquele fim-de-semana. Já era noite, não encontrámos nenhuma oficina aberta, pelo que só no dia seguinte poderíamos tentar resolver o problema do seu carro.
-Suponho que tem onde ficar...- quis saber.
-Tenho casa aqui. Este é o meu refúgio quando faço pausa de mulher casada...E você, onde vai ficar?
-Tenho reserva no hotel...Não venho muitas vezes, por isso não posso ter casa própria...
- Se meu marido cá estivesse, convidava-o a ficar em nossa casa, mas assim....
- Agradeço na mesma....mas vou para o meu hotel. Mas primeiro deixo-a em casa para amanhã podermos tratar da oficina....
-Fico-lhe muito grata....

Deixei-a na casa que indicou ser a sua: uma pequena casa de praia, com piscina privativa e, adivinhava-se, mobilada com gosto.Combinámos tudo para o dia seguinte: quando acordasse telefonava-me para o hotel e iria levá-la à tal oficina.
Foi só à despedida que ela me perguntou:
-O seu nome?
-Mário....e o seu?
- Sofia

Depois de arrancar ainda vi, pelo espelho retrovisor, o seu aceno de adeus....





Capítulo 2

Continuado por: Maria Lemos


Chegado ao hotel, fiz o chek-in, dirigi-me para o quarto de onde se vislumbrava num canto, uma televisão. Á sua frente estava uma mesa rectangular com uma bomboneira repleta de bombons e do outro lado da mesa um pequeno arranjo floral. Dei mais dois passos vi a cama enorme, ao lado desta viam –se as janelas da varanda, corri a cortina, fui até à varanda e sentei-me numa das cadeiras que lá se encontravam e apreciei o espectáculo do pôr do Sol.

Quando o Sol finalmente beijou carinhosamente o mar, insurgiu repentinamente a lembrança dos seu rosto, de como seria poder tocar na sua pele, nos seus lábios, de quanto seria maravilhoso poder estar com ela mais tempo. Cada raio que espelhava no oceano, me levava á lembrança dos seus cabelos, do seu sorriso, do seu olhar.

No final do jantar, fui caminhar até á praia, pois não conseguia simplesmente estar ali. Chegado ao areal, descalcei os sapatos, tirei as meias, dei umas quatro dobras nas calças, e caminhei sem direcção, ouvindo apenas o ruído do rebentar das ondas, que de quando em vez, molhavam os meus pés. Apenas se viam muito distante umas luzitas, que imaginei fossem de algum navio de carga e o brilhar da lua a reflectir na água, e pensava na partida que hoje o destino me tinha feito. Eu que não acreditava no amor à primeira vista, que nunca parava no meio de uma estrada para auxiliar quem quer que fosse, questionava-me quase constantemente, porque parei, porque dei boleia, porque não paro de pensar nela, porquê e mais porquês. Até que, vi uma mulher de cabelo loiro e preso, vestia fato de treino de cor clara, sentada na areia. No entanto, parecia estar a viajar para muito longe daquela praia e à medida de me ia aproximando, vi o mesmo rosto que teimosamente não saia da minha memória. Quando me aproximei o suficiente para ter a certeza que era ela , os meus passos abrandaram, até ao momento de ficar imóvel. Não queria acreditar, estaria louco, de tanto a imaginar já a estaria a ver ali. Até que ouvi uma voz muito delicada, que me chamou: -“ Mário, Mário!” Ainda hesitante, dei por mim a caminhar na sua direcção, quando finalmente acabei de dar os dez passos mais longos e demorados da minha vida, Sofia, estendeu a mão e convidou-me a sentar um pouco ali, tudo parecia perfeito, o local do encontro, o luar, as conversas, exceptuando o facto de estar com uma quantas dobras nas calças e sapatos nas mãos.

Reparei que estávamos a ficar com um pouco de frio e convidei a Sofia tomar um chá quentinho no hotel onde estava hospedado, ao qual ela assentiu, fomos a caminhar pela praia, quando de uma forma muito espontânea e natural ela meteu o braço no meu e continuamos a conversar, sobre as coincidências de nos termos conhecido, das motivações que me levaram a passar ali aquele fim-de-semana, enfim falamos dos nossos tempos de estudantes e de outros assuntos que não nos comprometessem de mais.

Chegámos ao hotel, eu agora calçado e as calças devidamente vestidas, dirigimo-nos até ao bar, perguntei à Sofia o que ela desejava ao que me respondeu: - “Um chá de camomila, preciso de acalmar, pois hoje tenho vivido mais emoções que nos últimos anos da minha vida.”, dito isto, brindou-me com um sorriso ainda mais belo que aquele que esboçou quando a vi pela primeira vez. Olhou para o relógio, mais que uma vez, senti que algo a perturbava, e perguntei-lhe: “ Sofia, estou a aborrecer-te?!” ao que ela respondeu prontamente: “Não, não é nada disso, é que já há anos, muuuuitos anos, que não estou assim, com outra pessoa além do meu marido… e também já é um pouco tarde, mas ainda tenho que lhe pedir uma coisa….” Quando ela proferiu estas palavras, senti um sopro gelado a percorrer-me a coluna e paralisei e ela continuou “é se me podes acompanhar até casa, não é muito longe, mas já são 23:45h e tenho um pouco de medo de andar sozinha pelas ruas a estas horas.” , ao que respondi de imediato que sim, no entanto não deixei de me questionar o porquê daquele pedido, visto que nesta cidade não existe (pelo que me lembre) situações de qualquer espécie de criminalidade.

Acabamos o chá e levei-a até casa, não demoramos mais que cinco minutos de percurso, ao chegarmos ao portão...

Continua...

Capítulo 3

Continuado por: Orlando Dias Agudo


Quando parei o carro defronte o portão, o telemóvel de Sofia tocou. Ela pareceu surpreendida, mas antes de sair do carro, prontificou-se a atender. Ouviu mais do que falou. Da sua boca saíram apenas monossílabos, dando a sensação de que aceitava tudo o que lhe diziam. Foi um telefonema curto, que terminou com “um beijo” meio envergonhado. Quando desligou não me contive e perguntei:
-Algo de inesperado?
- Não, nem por isso…
- Pareceu-me teres ficado surpreendida…
( Arrisquei aqui um tratamento mais intimo, só para experimentar a reacção de Sofia )
- Não…mas gostei desse tratamento por “tu”…podemos continuar…e se queres saber o conteúdo do telefonema, talvez seja melhor entrarmos…
Era uma forma indirecta mas eficaz de me convidar a entrar. Acedi. E quando entrámos, ela convidou-me a sentar num largo e confortável sofá, enquanto ela iria trocar de vestimenta…que de fato de treino não é próprio de quem recebe alguém em casa, argumentou.

Quando fiquei sozinho, passeei os olhos pelas vastas estantes que emolduravam as paredes. Livros de ciência e também de literatura, obras de autores portugueses e também estrangeiros. Duas enormes telas completavam a decoração da sala e embora eu não fosse nem por sombras um “expert” na matéria, apostaria que eram de autores de renome.
Passados alguns minutos, Sofia regressou. Vinha espantosa de beleza, com um vestido que deixava antever, sem batotas, a perfeição do seu corpo. Ela sabia que era bonita e bem feita e não procurava esconder nada…
Dois copos, uma garrafa de whisky e estava criado o ambiente para finalmente ela me dizer o conteúdo do telefonema.
- Sabes quem me ligou?
- Não faço a mínima ideia….não conheço a lista dos teus amigos…
-Foi meu marido…
- A conversa foi fria….diria eu!
- Talvez…telefonou-me de Londres a dizer que não pode regressar hoje. Nem talvez no fim-de-semana.
- Tinham combinado encontrarem-se aqui…
- Sim, mas pelos vistos não pode…
- E vais ficar sozinha todo o fim-de-semana?
- Não tenho outra solução…mas talvez possa contar com a tua companhia…
(Um sorriso malicioso, a roçar a provocação, bailou-lhe nos lábios)
- Podes contar comigo. Aliás será com muito gosto que te farei companhia…

A conversa não foi muito mais longe. Confirmou apenas o que tinha dito quando lhe dei a boleia: que o marido viajava muito, hoje estava em Londres para a semana talvez em Bruxelas, afinal um homem de ciência que espalhava o seu saber em conferências por esse mundo fora. Foi a pensar que o poderia acompanhar, que tinha desistido de dar aulas…Mas isso foi só nos primeiros tempos. Depois ele começou a ir sozinho, deixando-a ou em Lisboa ou ali naquele recanto.
Era já tarde. Passava da uma da manhã quando deu conta que tinha de regressar. A bela companhia convidava a continuar, mas não podia ser. Tanto eu como Sofia precisávamos de dormir. Assim sendo, levantai-me do sofá e preparei a despedida, não sem antes a lembrar que no dia seguinte, logo de manhã, tinha de ligar ao serviço de assistência em viagem, para que o seu carro fosse transportado para Lisboa. Ela disse que o faria…
Combinámos novo encontro para o dia seguinte, para um almoço num local muito discreto que eu conhecia.
À despedida ofereceu-me a face para um beijo de despedida: nos meus lábios senti o aveludado da sua pele como senti a sua mão docemente pousada no meu braço.
Segui para o hotel com a certeza de que no dia seguinte o almoço seria magnífico.

Continua ???


Capítulo 4

Continuado por: Maria Lemos




Ao chegar ao hotel, fui directamente para o quarto, abri a porta de acesso à varanda. Sentia-se a brisa e o cheiro inegável a maresia, foi então, que me sentei debruçando os cotovelos sobre os joelhos, e com as mãos tapava a cara, esperando que as dúvidas que me assolavam se dissipassem, como a brisa que passa e refresca.

Não compreendia o que sentia em relação a tudo o que estava a viver, talvez, se deva ao facto de estar a experimentar estes sentimentos pela primeira vez. Mas que sentimentos, podia estar a sentir, se eu só a conheci à poucas horas? Será apenas, a sempre presente atracção física? Ou será algo mais? Será que sinto o que sinto por estar só?

De uma coisa eu tenho a certeza, provei pela primeira vez o gosto amargo da solidão… Nunca me havia sentido tão só como naquele momento. Nunca tinha experimentado a necessidade de fazer uma retrospectiva no campo amoroso e fi-lo com o intuito de provar, a mim mesmo, de que o que estava sentir pela Sofia, era completamente novo e não uma atracção passageira. O que era um problema. E um problema gravíssimo, a mulher por quem estava apaixonado era casada… bem ou mal ela era casada.
Estava muito ansioso para o almoço do dia seguinte, era uma espécie de uma partida para alguma coisa mais, para alguma coisa incerta!
Levantei-me a tempo de ver o sol nascer, a cama era verdadeiramente confortável, mas não consegui estar mais tempo deitado, parecia que pelo facto de me levantar as horas passariam mais rapidamente, e obviamente mais rapidamente chegaria a hora de a ver, de estar com ela, de sentir o seu perfume, e talvez de a beijar…
Chegou a tão ansiada hora.

Dirigi-me atempadamente para o restaurante onde havíamos combinado o almoço, escolhi uma mesa para dois com vista para o mar e para as dunas, a paisagem era fabulosa, digna de uma tela. O clima estava criado nada podia correr mal.

Passados 30 minutos da hora marcada ainda não tinha aparecido, estava a ficar nervoso e preocupado, pois questionava-me por que razão a Sofia ainda não aparecera, e como se isso já não fosse o suficiente, o empregado de mesa já tinha vindo mais uma vez ao pé de mim perguntar-me se podia começar a trazer os aperitivos, o que me irritava ainda mais.

Já passada quase 1 hora de espera, o empregado além de trazer o cardápio trás também um envelope muito pequeno, quando chegou ao pé de mim, perguntou o meu nome e após a minha resposta, entregou-me o envelope que vinha ao meu cuidado, olhei para todo o lado na expectativa de ver a Sofia, ela tinha estado ali … e … não veio ter comigo. Hesitei em abrir, o envelope, sentia uma espécie de revolta, senti-me menosprezado. Perguntando-me se esteve aqui, porque não veio falar comigo olhos nos olhos?! Não eram necessários bilhetes, a adolescência tinha já passado há anos, portanto se me queria dizer algo porque não o fez? Ela esteve aqui, caso contrário quem entregaria a carta ao empregado?

Mais calmo, chamei o empregado e questionei-o sobre quem lhe havia entregue o envelope, e a descrição que ele fez correspondia à mesma caracterização física da Sofia.

Ignorando o porquê de tudo aquilo, decidi abrir o envelope, certamente encontraria ali a resposta. Tirei um pedaço de papel que estava dobrado em quatro partes e senti o perfume dela, desdobrei-o e li:

“Lamentavelmente não poderei usufruir da tua companhia hoje. Surgiu um imprevisto, o meu marido, ligou-me e está a chegar, parte novamente amanhã. A propósito estás muito bonito e a mesa era a ideal. Um beijo Sofia”

O mundo desabou sobre mim naquele momento, senti-me o mais desafortunado dos homens…
No caminho para o hotel, passei pelo mercado local, para me distrair um pouco, quando não é o meu espanto quando vi a Sofia acompanhada pelo marido e ….



Continua...




Capítulo 5

Continuado por: Orlando Dias Agudo




...e fiquei ainda mais desorientado quando reconheci imediatamente o marido de Sofia: era o Gabriel, meu companheiro de liceu, um predestinado para as matemáticas, pouco dado até a namoricos, mas que, pelos vistos, tinha conseguido casar com uma mulher de sonhos. Quando me viu, Sofia fez questão em chamar por mim. Dirigi-me para o casal e tal como eu havia reconhecido imediatamente o Gabriel, ele também me reconheceu de imediato. Caímos nos braços um do outro, perante o olhar estupefacto de Sofia e o diálogo logo funcionou:
- Mario, como é bom rever-te! Há anos que não nos víamos...
- Pois, tu nunca vais aos almoços da malta...
- Sabes, a minha vida transformou-se um pouco...Depois da faculdade, as coisas encaminharam-se depressa demais e hoje sou mais escravo do que um ser humano com agenda livre....

Sofia olhava para nós completamente absorta. E foi ela quem interrompeu aquele diálogo:
- Mas...vocês conhecem-se?
- Claro que sim – adiantou-se Gabriel – nós fomos colegas de liceu e depois as nossas vidas seguiram rumos diferentes...
-Mas este é o Mario que me salvou no meio do nada, quando fiquei sem automóvel...
- Foste tu ?
- Fui....mas fiz apenas o meu dever....
- Temos de comemorar este encontro e tenho de te agradecer o facto de teres safado a Sofia de um problema...Olha: vens hoje jantar connosco e a nossa casa. Não me digas que não podes...
- Poder posso...mas se calhar estrago os vossos planos...

Sofia salvou a situação:
- Não temos nada combinado...Aliás quem encomenda jantar para dois, encomenda para três...

E ficou combinado o jantar. Não deixei de reparar no agrado que a ideia provocou em Sofia, que me fulminou com um olhar malicioso que eu não esperava. E não evitou um piscar de olho ainda mais provocante, que me arrepiou perante a hipótese de Gabriel poder ter visto e interpretado mal.
A caminho do hotel não deixei de pensar no Gabriel que eu conhecera: era um rapaz algo introvertido, que só via número á sua frente, daí ter escolhido uma área de ciências enquanto eu havia seguido letras. O que me admirava era ele ter conseguido uma mulher daquelas, bonita de verdade e com um corpo de espantar. Decerto que durante o jantar ia conseguir descobrir como tinha ele conseguido alcançar aquela meta.

O jantar estava marcado para as 9 da noite. Mas fiz questão de chegar um pouco antes. Quando bati á porta foi Sofia quem veio abrir. Antes de me mandar entrar, brindou-me com um beijo na boca que me deixou atarantado. Depois disse:
- Entra. O Gabriel foi encomendar o jantar e ainda não regressou. Ainda bem que vieste mais cedo...

Continua...



Caro leitor, agora é a sua vez de dar continuidade a este conto.
Aceita este desafio ? Então, envie-nos o seu texto para: ordapt@yahoo.es


2 comentários:

Anónimo disse...

tasse mesmo a ver, que o Mário vai voltar para trás a qualquer pretexto e... pimba!!! ;)

Anónimo disse...

Esta estória, vai ter um final como em quase todos os contos;
"casaram e tiveram muitos meninos, loirinhos e de olhos azuis"

Aposto que será mais ou menos isso...

F. Cunha - Olivais