domingo, novembro 26, 2006

Regresso em massa da Suíça





Domingo, 26 de Novembro de 2006


Regresso em massa da Suíça

15 mil voltam para Portugal

Até ao final do ano cerca de 15 mil emigrantes portugueses na Suíça devem regressar definitivamente ao nosso país, aproveitando a possibilidade de levantar, na totalidade, a verba que ao longo da carreira contributiva descontaram no âmbito de um fundo de complemento da reforma conhecido como ‘segundo pilar’.

Apesar de, graças a um acordo recente, os emigrantes portugueses continuarem a ter direito de opção entre o levantamento do capital e o complemento de reforma para lá de 31 de Dezembro deste ano, notícias recentes davam conta de um ultimato das autoridades suíças, segundo o qual ou levantavam o dinheiro até ao final do ano, viajando definitivamente para Portugal, ou ficavam sem ele. Muitos optaram por não arriscar e marcaram para estes dias o regresso à terra natal.

“É verdade. Existe uma tendência para o regresso imediato pelo facto de as pessoas desconhecerem a existência deste acordo e também por se atravessar nesta altura, em nosso entender injustificadamente, um momento de algum alarme e até de suspeição”, disse Manuel Beja, conselheiro das comunidades portuguesas eleito pela Suíça.

Para este responsável, emigrante há 34 anos e profundo conhecedor da situação helvética, “o acordo assinado entre as instituições suíças e portuguesas permite o levantamento destes fundos, mesmo a partir do final do ano. Isto é o que nós temos dito em todas as reuniões e encontros com as comunidades. No entanto, cada um faz aquilo que bem entender”.

O regresso em massa a Portugal, para muitos o maior depois êxodo das antigas colónias portuguesas, tem a ver com o facto de muita gente ter direito a quantias bastante significativas e de não querer arriscar a perda dessa verba.

“Há pessoas que têm a receber mais de 500 mil euros, o que é muito dinheiro. E quando começa a constar alguma coisa, o melhor é prevenir, porque não há fumo sem fogo”, disse ao Correio da Manhã António José Fonseca, emigrante na Suíça há quase 25 anos.

Apesar de não ter tanto dinheiro a receber – “pouco passa dos 200 mil euros” – este emigrante diz que não vai arriscar ficar sem ele.

“Nós aqui descontamos muito dinheiro com o objectivo de termos um benefício um dia mais tarde. Ora, não vamos perder esse benefício e continuar aqui a trabalhar no duro”, explicou António Fonseca.

Também Alice Carneiro, que trabalha num hotel no cantão de Genebra há mais de 20 anos, decidiu fazer as malas e deixar o país para não perder os mais de 160 mil euros a que tem direito. “Tenho 55 anos e não consigo juntar esse dinheiro até à idade da reforma. Por isso, vou-me embora e reorganizar a minha vida em Portugal”, disse a emigrante ao CM.

Apesar deste provável êxodo de cerca de 15 mil pessoas da Suíça para Portugal, a verdade é que a emigração portuguesa para aquele país não pára de crescer.

Só em 2005, obtiveram autorização de trabalho na Suíça 7200 portugueses, a maioria dos quais para as cidades de Genebra e Zurique. Nesta altura, a comunidade portuguesa naquele país deve rondar as 200 mil pessoas.

PAÍS DOS ALPES ACOLHEU 46 MIL PORTUGUESES EM CINCO ANOS

A entrada de portugueses na Suíça quase quadruplicou entre 2001 e 2004, revela o último relatório da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico. ‘Perspectiva das Migrações Internacionais’ indica que a Suíça lidera na escolha dos emigrantes nacionais. Partiram para o país dos Alpes cerca de 12 mil no último ano e 13 600 em 2004.

Em 2003 foram 10 100 os que ali procuraram trabalho; em 2002 emigraram 6600; e em 2001 foram 3700. Este crescimento levou a que hoje vivam na Suíça cerca de 160 mil pessoas de nacionalidade portuguesa. Há ainda mais de 20 mil suíços luso-descendentes ou portugueses que obtiveram passaporte suíço. Um número estimado em mais 20 mil representa uma população flutuante, na maior parte trabalhadores sazonais. Turismo, restauração e construção civil ocupam grande parte da comunidade portuguesa, a terceira maior estrangeira depois da italiana e da sérvia.

"ACABOU A TRADIÇÃO HUMANITÁRIA DA SUÍÇA" (Manuel Beja, conselheiro das Comunidades portuguesas eleito pela Suíça, diz que, apesar de não afectar os portugueses, a nova lei da imigração é discriminatória)

Correio da Manhã – É verdade que milhares de portugueses se preparam para deixar definitivamente a Suíça por causa do chamado ‘segundo pilar’?

Manuel Beja – Em primeiro lugar é necessário referir que estamos a falar de algo único no Mundo. Na Suíça foi criado um fundo de Previdência Profissional obrigatório como complemento do seguro oficial de velhice e invalidez, que ficou conhecido como ‘segundo pilar’. Tratou-se de uma forma de assegurar a manutenção do nível de vida habitual no período da reforma. No entanto, estes fundos podem, caso o assegurado o entenda, ser levantados na condição de deixar definitivamente a Suíça e fixar residência em Portugal. Não é uma situação nova, existe desde que este sistema entrou em vigor. Nos últimos meses, constou que quem não levantasse o dinheiro até ao final do ano corria o risco de ficar sem ele, o que fez com que muita gente decidisse regressar a Portugal.

– Mas as pessoas têm ou não razão para pensar dessa forma?

– Não. É exactamente o contrário! Tudo depende da situação financeira e pessoal do interessado e muito particularmente da questão principal: a esperança de vida. Há pessoas que preferem o capital líquido deste fundo; outras preferem a reforma. Nós temos dito sempre que há um acordo assinado entre as instituições suíças e portuguesas que permite, mesmo após 1 de Junho de 2007, o levantamento destes fundos.

– No entanto, podemos presenciar o regresso a Portugal de 15 mil emigrantes?

– É verdade. Existe uma tendência para o regresso imediato pelo facto de as pessoas desconhecerem a existência deste acordo. Quanto a nós, conselheiros da comunidade, temos o dever de esclarecer as pessoas. No entanto, cada um pode fazer aquilo que muito bem entender.

– Como analisa a nova lei da imigração da Suíça?

– É importante dizer que esta nova lei não afecta directamente os portugueses residentes na Suíça nem qualquer cidadão da União Europeia. No entanto, moral e politicamente, não nos identificamos com os resultados do referendo. Não podem entrar na Suíça imigrantes de fora do espaço europeu que não tenham sido previamente contratados, o que dificulta a instalação de famílias. Esta lei quebra a tradição humanitária da Suíça. Foi por isso que muitas organizações religiosas e sindicais declararam o dia do referendo como “um dia negro para a Suíça e para a democracia”.

PERFIL

Deixou Portugal na época ‘do salto’. Atravessou a fronteira clandestinamente e procurou melhor sorte em França, na Holanda e na Alemanha. Foi na Suíça que fixou residência há 34 anos. É um veterano da emigração. Sindicalista, coordenador do Conselho das Comunidades Portuguesas neste país, membro de várias comissões de defesa dos direitos dos emigrantes, Manuel Beja, 64 anos de idade, é um dos mais profundos conhecedores das realidades e dos problemas dos emigrantes.

APONTAMENTOS

QUASE 200 MIL

Apesar de estar previsto o regresso de 15 mil emigrantes portugueses na Suíça até ao final deste ano, a verdade é que a comunidade portuguesa naquele país não tem parado de crescer, a uma média de quase dez mil pessoas por ano. Nesta altura residem e trabalham na Suíça quase 200 mil portugueses.

NOVO DESTINO

Espanha é, actualmente, um dos países para onde os portugueses mais emigram, pela proximidade e pelo crescimento económico. Agricultura e construção civil são as actividades que mais portugueses empregam no país vizinho. Muitos vão e vêm todos os dias ou ao fim-de-semana, mas são cada vez mais os que lá fixam residência. Nos últimos dois anos foram 20 mil.

A SALTO PARA FRANÇA

Foi durante quase quatro décadas o grande destino da nossa emigração. Aliás, é em França que reside uma das maiores (se não a maior) comunidades da diáspora. No entanto, o aumento do desemprego, a partir de meados da década de 90, ditou o abrandamento da emigração para a França.

OS PROBLEMAS

O Canadá e, mais recentemente, a Holanda estão na memória dos portugueses como países de dificuldades para os emigrantes. No Canadá, no ano passado, expulsaram quem não tinha papéis. Na Holanda, cerca de uma centena de portugueses foram enganados, ao ponto de passarem fome.

PALOP E BRASIL

Apesar de atravessarmos uma época em que, por norma, são os africanos e brasileiros que emigram para Portugal, há cada vez mais portugueses a escolherem as antigas colónias como destino. Sobretudo ao nível de mão-de-obra especializada e na qualidade de quadros de empresas portuguesas ou multinacionais.

Secundino Cunha, Braga / Manuel Araújo, Lusitano de Zurique

4 comentários:

Lesma Morta disse...

Apenas para mandar um abraço de Portugal e felicitar pelo blog.

Jorge Santos Silva

Lisboa

Eva disse...

Boa tarde,

sou estudante da Univeridade de Lisboa, mas estou em Erasmus na Univesidade de Genève e gostaria, se for possivel, que me autoizasse a utilizar este artigo, que darei como exemplo num trabalho que estou a fazer sobre a emigração portuguesa!

Por favor,

Aguardo resposta,

Atenciosamente

Eva Babo

Eva disse...

Boa tarde,

Sou estudante da Universidade de Lisboa, mas em Erasmus na Universidade de Genève, e gostaria muito que autorizasse a utilização deste seu artigo no meu trabalho sobre a emigração portuguesa, por favor, se for possivel.

Agradecendo com antecipação

Atenciosamente


Eva Babo

Manuel Araújo disse...

Cara Eva, o artigo já não é actual, mas pode utilizá-lo da forma que entender.
Bom trabalho,
Manuel Araújo

www.manuelaraujo.pt